sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Tortura filosófica


Tortura filosófica

"José Sócrates, purificado por um mestrado em Paris, aparece aos palavrões para vender o seu livro sobre confiança, ao lado de Lula da Silva e Mário Soares. Todos membros da esquerda possível (por azar, nos tempos que correm, aparentemente impossível, a não ser em filosofia da treta).
Não li o livro, mas terei que o ler em breve. Trata de tortura, o que calha no âmbito do meu estreito campo de intervenção. Escrevo agora para registar o valor dos meus actuais conhecimentos sobre o assunto e com base nas passagens da apresentação do livro que ouvi na televisão. Sinto-me capaz de fazer a crítica do que está escrito, sem perguntar em que dia da semana foram feitas as provas e sem querer saber sob que primeiro-ministro a deputada Ana Gomes questionou o governo de Portugal sobre a colaboração dada à CIA para transportar pessoas para serem torturadas em prisões secretas na Europa.
A filosofia da tortura falará da tortura feita sobre presos políticos, por distinção da outra feita sobre presos sociais. É o que se chamará filosofia política da tortura. Isso permite omitir a tortura praticada sob o governo Sócrates, em Portugal. Apenas porque essa tortura não foi reconhecida oficialmente, como ocorreu nos EUA. A tortura não reconhecida, nomeadamente aquela praticada regularmente nas prisões norte-americanas ou portuguesas contra pessoas previamente desqualificadas socialmente, essa tortura não é tortura. Pelo menos do ponto de vista da filosofia política do Sócrates. Essa tortura não é expressamente encomendada pelos políticos de serviço: é uma tortura que, do ponto de vista da disciplina filosófica do autor, servirá apenas para treinar e manter operacionais os torturadores para quando forem politicamente necessários – tentação a que um político democrata deverá resistir, para não concretizar o seu lado mais obscuro e maléfico, mesmo em tempos extremados.
Politicar, na expressão brasileira do Lula da Silva, será, em conclusão, a forma de recompor um qualquer aldrabão num esquerdista a filosofar, elevando-se assim da plebe e arrastando multidões agradecidas pelas prebendas democráticas distribuídas a seu tempo – coisa que lhes faz falta nestes tempos de comunhão com o resto da população nos dissabores da austeridade. Com Sócrates no poder, seriam maiores as oportunidades para as duas salas dos seus muitos amigos de passarem a ser eles – em vez dos da direita – a receberem os pagamentos pelos serviços prestados na venda do país aos interesses do capitalismo. Isso é que é a verdadeira tortura. Filosófica e de ciência política. Interdisciplinar, portanto.
Será o livro lançado por Sócrates capaz de me desmentir nalgum ponto? Se o for, pessoalmente retiro todos os outros pontos, mesmo o que manifestamente são verdadeiros."
A P D
Lx, 24 Outubro 2013

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